01 setembro, 2008

Tortura

A partir da divulgação das prisões secretas americanas, transformadas em laboratórios de tortura, vale um fato óbvio. Do lado que nos cabe - neste latifúndio que se chama Brasil - merecemos respeito, afinal também torturamos, e muito.

No passado, pretos, escravos, índios e judeus expatriados - negados à acolhida respeitosa. Há alguns anos, por diferenças políticas, torturamos médicos, filósofos, escritores, músicos, estudantes, artistas, religiosos. No presente a tortura é menos seletiva, invisível e menos óbvia. Tipo pobre em cadeia, meninas estupradas e seviciadas - com a indiferença do Estado - garotas escravas em casas de patroas malucas, garotos do tráfico por facções rivais, e um resto de miséria que justifica nossa barbárie e insolúveis diferenças culturais e sociais. Faz parte do show.

Assim é simples assim. Somos bárbaros. Dúvida? Não temos idéia de nossos pequenos e endiabrados atos cotidianos, silenciosos e injustificáveis.

Tomando emprestado ao Hélio Pelegrino, nossas diferenças podem ser levadas a extremos e ainda assim as justificaríamos. Persiste atual o espírito da tragédia grega - por uma bela Helena somos todos gregos e troianos. A crueldade é mãe de nossas doenças, que não se curam com prozac, esctasy, viagras, anestésicos psíquicos ou congêneres.

Agora, justificar atrocidades com leis e embasamento jurídico-religioso é remetermo-nos de volta às cavernas. É aceitar o fanatismo, intolerância, ódio, percurso tribal de extermínio, genocídio, posse territorial, exercício desumano do poder, infâmias e covardias. Isso vale para nós tupiniquins ou gringo ‘cara-pálida’ de qualquer espécie.

O homem é senhor de seus atos e deve ser responsabilizado pelo Estado civilizadamente constituído, justo e humano! Se o Estado é conveniente com torturas é criminoso - citando o que se diz por aí a boca grande. O que é muito sério e requer reflexão acurada, sem concessões ou complacência.

Não há lições morais neste texto, mesmo que se insista que sim. A constatação mais imediata é que vivemos numa época de pesadelo e horror. É só se colocar no lugar das vítimas. Pense na criança numa cadeia cheia de marmanjos enlouquecidos de ódio e testosterona. É de sangrar o coração.

(Pedro Cruz)