26 julho, 2008

Sonhos

A água escorre pelo vidro da janela. Lá fora carros escorrem na via - expressa deslizando sobre a água da chuva. Às vezes nos deslocamos assim, rápidos, na substância dos sonhos. Somos vôo e voar, pensar e estar, ser e sentir, acordar, dormir e acontecer.
Campos de flores transparentes, margaridas do tamanho de sóis, girassóis imensos, sorrisos enormes num céu aberto de verão. A voz do rio cantando nomes que rolam sobre as pedras que as lavadeiras embranqueceram e amaciaram.
Um homem que se lembre de fitar a palma da mão enquanto sonha desperta dentro do sonho. No mundo de Morpheus as regras são tênues. O Omã da Pérsia que trocou seu reino por um Sonho se fazendo Deus não pode mais dormir pois o Universo se destruiria.
Esse é o Caminho do homem acordado dentro do Sonho que acontece dentro de sonhos.
Um homem se sonhou borboleta imaginando-se homem. Outro acordou inseto lembrando que era escritor. Um negro ‘teve um sonho’ na América e acordou com um tiro no peito. Assim me deito pra sonhar e do meu coração o broto da rosa arrebenta para a luz e seus ramos buscam flores de ouro.
Alguns preferem sono sem sonhos. Pressentem algo que nos escapa.
Já me seduziram para sonhar colorido em cores extremamente vivas. Hoje sonho com o leão ferido que atravessa comigo o jardim do mosteiro. É imenso, quase bate no meu ombro, mas não me amedronta. Chego ao portão de ferro que delicadamente se abre sem toque. O felino se recusa a ir além. Acordado penso em Jung e seu ‘daimon’ que lhe instruía à beira do lago próximo à torre circular que construiu com as mãos. Não se deve temer sonhar.

(Pedro Cruz)


Justiça

Com que sonha João-ninguém, imperador do lixo, jogado sujo em seu castelo de papelão podre, à sombra do hipermercado vinte e quatro horas por dias, semanas, meses e anos à fio com máquinas devorando dinheiro e sonhos dos escravos por consumo?
De vez em quando anda pelo bairro empurrando um carrinho de supermercado cheio de nada, tralhas, contendo tudo. Gritando prá qualquer um na rua sua raiva de esfomeado, de tantas brutas fomes que estão prestes a se tornarem insaciáveis por uma eternidade.
João, que tem por súditos uma multidão de zés-ninguéns, que habitam nos vãos dos viadutos de Brasília, cidade que dorme em berço esplêndido tendo lânguidos sonhos de drogas, corrupção, morte, traição, celas em hotéis de luxo e paraísos fiscais invioláveis.
João de “deus” a deus-dará com sua corte de revés jogada na sarjeta, relento, várzeas e esgotos, comendo o pão que o político amassa, o juiz assa, o banqueiro deixa apodrecer e o sacerdote-pastor oferece como milagre de multiplicação e remissão de pecados.
João sonha com justiça e espero que esse sonho amanheça ao seu lado e vá para as ruas gritar justos e rudes impropérios que se façam ação, transformação e realidade, e acorde os Senhores da Corte fechados em seus palácios de merda.

(Pedro Cruz)

08 julho, 2008

Palavras do Lobo:

“O Brasil é um pé de pau que é minha cruz e nau.”

“O sol é o manto do pavão.”

“Se a luz no assoalho de espelhos refletir o Divino em metamorfoses de imagens e letras, o que será da criada que não limpou e poliu o chão direito? Pensamento da Soberba.”

(Pablo Lobo)