18 fevereiro, 2009

Jerusalém em Guerra 07

Permita-me a vaidade de rasgar estandartes de ferro e queimar papéis d’água. A vida é breve como um sopro e o mar da eternidade é de sal e esquecimento. Por veloz momento queimamos e desaparecemos. Abraçamos corpos de ar, beijamos hálitos em espelhos e desejamos o que não nos pertence. Nessa terra a herança é dor e guerra, o que nada justifica. Também não nos livra de culpas. Cada dia é feito de combates, pequenos e grandes pecados, pedaços de tédio, imensas ousadias, risos fechados a zíper, derrotas inesperadas e vez por outra vitória que não vale mesmo um puto furado. E na paisagem tem sempre um muro, tá lá bem erguido, se cai surge um novo. Acaba que a história é sobre muros e sua substância, visto por um lado ou pelo outro, ou por quem fica em cima do muro insistindo que o muro não existe ou é uma construção semântica.

(P Cruz)

11 fevereiro, 2009

Jerusalém em Guerra 06

A boneca de pano tem cheiro de mãos, beijos, de retalhos. No escuro perdeu um botão do vestido pintado de balas coloridas semelhantes a olhos. Só tem um sapato calçado ao contrário, tipo direito no esquerdo. Se não lhe tiram a pilha fica chamando pela mãe que virou moça e não pode ter filhos. Boneca tem cheiro de sótão, flor no cabelo e água de rio, batom e câncer. É que esse maldito impregna raizes nas coisas anos antes de brotar e se abrir em flor. Jara Milena tem cabeça raspada e olhos de medo.

(P. Cruz)

09 fevereiro, 2009

Crina

Que perfume você usa na crina? Cílios postiços você não querida colírio usa na retina, veneno nos lábios demoníacos de anfetaminas? Que fêmea se insinua entorpecida na sua língua ambígua de adrenalina? Na boca amarga de cerveja e endorfinas que gozo físico te sangra os lábios lilases e ruboriza o verde alcalóide dos olhos lívida de heroína? Qual a cor da sua aura, letra de cabala, leite de cabra, chili, inconsciente de Mr. Freud dopado de cocaína? Que shampoo você usa na crina vermelha alquímica que escorrendo sobre transparência branca molha seus seios de ponta taurina? Que amor recorrente a te acorrentar ao inferno algema asas ao calcanhar como má sina? Que voz geme anima de boca a ouvido o sol roubado a cada dia? Você sobe ou cai se o ar lhe falta vôo ou troca a pele da face por medo de ser solitária ou cretina? Que místicos delírios exorcizam a neurose de seus músculos rígidos de dor e movimento no limite proibido entre Édipo e Antígona, puta bailarina? Qual fúria te assola as costas áridas num flagelo sublime de classe fútil? Em que espelho te miras, devastado em cacos por agudo de voz insana, jorrando realidades de deuses sujos e famintos que incorporas em mediunidade lasciva? Que nudez profana na performance de vazios e fome uterina? Que mão então tocaria sua flor de prata e frágil platina, e que cópula de míssil ou fissura de átomo te negaria a ruína, moça argelina?

(P. Cruz)