14 junho, 2009

Cavalos de Théodore

Desisti dos desenhos e dos poetas franceses. Está tudo muito caro e claro. São desejos e poderes. Hoje não há França, Paris, museus, cafés ou jardins. Há o frio.
Desisti dos cavalos de Théodore e suas faces eqüinas humanas. Nada de cartão postal ou perfumes que não sejam das putas tristes paridas, narcotizadas, de sorrisos sobre suores de corpos muitos, anônimos.
Desisti idem, de tapetes persas ou narguilés. Turquia à margem da Europa. Deixei o fado, Pessoa, ou cá Buarque. Abro meus livros e estão em branco. Se esforço-me para ler parem clones de formas e sons correspondentes. Numa palavra: POLÍTICA.
Nos livros. Numa página: POLÍTICA.
Desisti da casa de campo, datcha, choupana, haras, castelo de cartas.
O morro está vazio. Nu, nem ventos sopram, calor, frio ou pássaros. Só a pedra do eco no vale abaixo e a palavra: TUDO.
Desisti do jardim de inverno, prazeres, jardim de Alá – perfumados ou de assassinos que se parecem com virgens negras ou poetas que rodam com o sol e planetas.
Ando descalço. Necessito das pedras da idade madura da razão.
Desisti dos sonhos. Decifrar o real é tarefa árdua. Andar por labirintos atrás de Borges já é tarefa grave.
Desdenho prazeres e dores. Inda vinho: sóbrio. Correto e rijo como o mar longe e inacessível.

(P.Cruz)
Beatriz de Dante
Me convidastes para passeios no Inferno. Fui.
Seduzido, deixei-me levar pela mão da beleza. Acessibilidades? Suscetibilidades?
Agora me olho no espelho. Eu e este homem estranhamente só. Inexplicavelmente só. Amedrontado com vazios na alma onde antes havia suavidade.
Concluí-se que o real é a imagem no polido vidro com arabescos nos cantos e irregular superfície.
Não há possibilidade de fuga. Fatos, não sonhos. Branco e preto sem cor intermediária ou nuances.
Estou calmo. Respiração e concentrada intenção mental. Roupa de letra e gramáticas em envergonhada pose despojada.
Não necessito pedir socorro. Nem da mágica de signos projetados na minha face ou letras atadas na ponta do lápis descrevendo o indescritível da vida.

(P.Cruz)

03 junho, 2009

Zero

Minha Magnum 45 nem pensar!
A Uzi tem defeito,
A tecla de gatilho só liga favores.
Minha besta e flechas certeiras
Pronta para
errar alvo é de brincadeira.
Esqueça armas.

Livros espalhados pelo cômodo.
Versos que não guiam seu destino.

Meu MP4 meio travado,
E mesmo com as janelas fechadas,
Se toco uma música no volume baixo
Parece que o mundo está aos pedaços.

(P.Cruz)
Louras?

Morenas me foram dóceis,
Louras cruéis,
Negras trágicas.
Louras falsas: falsas.

Intensas carnais,
Instintivas: todas.
Tolas as que amaram
No meu corpo
Ausências e sombras.

Intensas em minha
Cama
As etéreas de substância
Noite.

No beco da noite
Algumas foram
De crueldades tolas:
Louras.

(P.Cruz)