05 junho, 2008

Persóna, face, rosto, papel.

Deletei todos os e-mails da atriz que riscou na minha noite insônia. Todos os lacônicos mails compostos de monossílabo. (Ela é uma persona que se foi prá dentro das páginas do livro que esqueci aberto sobre o vidro negro da minha estante). Depois fui à minha lista de contato e apaguei seu endereço. Sou muito passional, às vezes não me reconheço, eu um cara assim tão pacato.

Depois, chamei silenciosamente seu nome. Não de qualquer jeito. Deixei que se desgarrasse dos meus lábios e fugisse para a noite.

Tomava um vinho siciliano. Com aromáticos blues de Billie Holiday, uma ponte longe demais. Não li Nietzsche, mas tentei escrever seu nome alemão sem conseguir. No entanto, o nome da atriz era fácil ser dito. É que sou meio assim: num instante possuído. Não por qualquer cara, bocas, risos, lábios. Vejo luz onde há opacidades. Sou mágico.

Intentei rápido uma ação mais imediata e necessária. No celular deletei nervosamente seus números. Ela que ligasse. Ela que escrevesse letras frias. Isso decorre em julho. Frio pra burro. Sou feito de abraços.

As mulheres que desejei, de certo modo passional, foram imaginadas em abraços breves e furiosos, na tentativa de apagar seu rosto de minha memória.

Então converso cá com meus vazios: cara, você sente as coisas intensamente, não seria adequado se intentar cartesiano? Fernando Pessoa deveria lhe insinuar um velho e bom porto. Seria o vinho? Se a lua é negra crie um céu claro que lhe defina contornos.

Sei que ela não vai ligar ou mandar notícias do Chile, para onde foi buscar o mundo. E não vai saber o quanto odiei e amei sua noite de fábulas, vanilla, morangos, amoras, amigos e tigres no tapete. Pra certas coisas sou indefeso, confesso.

Honras a Descartes: a feiúra e velhice são esteticamente exatas. Isso quer dizer nada.

Espero. Espera inútil. Bem sei. Ou nada sei. Se ela ligasse seria ótimo. Eu lhe falaria que um homem é feito de fúrias ou nada. Nesses tempos de dubiedades isso poderia parecer pretensioso. Mas, fui talhado à moda antiga. Minha mente pertence ao futuro. E essas coisas são assim: história de fúrias negadas; um vir a ser que não é; horas feitas de anos; noite de sombras. E isso vale esta maldita insônia.

(Pablo Lobo)