11 setembro, 2009

Espelho

É belo esse animal que agoniza,
É bela a morte desse animal
Corpo de leão,
Asas de anjo,
Cor de lobo,
Face de menino.

Ele não sabe o que agora sabe:
A vida se dissolve em dor,
Toda vida bela todavia efêmera.

Esse animal que agoniza e morre
Escorrendo substância de crença,
Sentimentos irreais,
Não se apegou o suficiente
À terra, à luta, à guerra,
À mente, a indiferença.

É um animal belo, e só.

Esse animal que foi criado
De fábulas, poesias, sonhos,
Desaparece da memória
Sem deixar vestígios.

É um animal triste e belo,
Feio e velho,
De pelos ralos,
Força vaga.

É um animal do qual
Pede-se misericórdia
Ou morte rápida.

Agoniza, e só.

A natureza o decanta,
Obsoleto.
Não habita esse tempo.
É arcaico, fútil,
Redundante, belo inútil.

Dos seus olhos de águia
Pedras túmulos brancos
Cruzes de ferro,
Pássaros entalhados em vôo.

Do corpo de leão
Farás tapete de pedra
Queimado
No sol do tempo.

Das asas de anjo,
Panos pobres trajes puídos
Com ossos à mostras,
Farás estandartes e roupas
De solidão e festas.

Da cor lobo
Que habita o coração,
Dirás invisível
Palavra que seja.

Da face de menino
Farás a máscara do
Xamã louco
Vestido em pele de leão,
Com olhos de águia na fome,
Com asas arrancadas às horas de fúria,
Com coração de lobo uivando a cor dos mortos,
Conjurando cavalos em fuga,
Se escondendo do sol
No viés escravo do dia
Entre buracos das horas
Em que o silêncio
Pronuncia sentença
De crueldade e força bestial.

(P.Cruz)

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